A aposta em sites de notícias, conteúdos multimédia e novas formas de
monetização digital permitiu ganhar escala. O impacto foi ainda mais profundo no
universo dos media regionais e locais. Como sublinha Pedro Jerónimo, professor e
investigador na Universidade da Beira Interior: “duas décadas de ciberjornalismo é pouco
tempo para conhecer as vivências de (ciber)jornalistas e redações, sobretudo ao nível
regional, local e até hiperlocal”.
Mas as dificuldades são também estruturais. O declínio da imprensa local em
papel em Portugal acompanha uma tendência internacional, bem documentada por
Rasmus Kleis Nielsen no seu Local Journalism (2017). Segundo o investigador do
Reuters Institute, o desaparecimento de jornais locais não foi compensado pelo digital: as
receitas publicitárias migraram para as grandes plataformas, deixando pouco espaço para
negócios sustentáveis no jornalismo de pequena escala.
Em Portugal, este cenário tem gerado respostas distintas. Se muitos projetos
fecharam, outros tentam reinventar-se em modelos híbridos. Web TV locais, como
analisou Francisco Rui Cádima (2008), surgiram como alternativa em algumas regiões,
explorando formatos audiovisuais online com baixo custo de produção. Embora com
limitações de escala, estas iniciativas provaram que há procura por conteúdos sobre temas
locais.
O Jornalismo local em Portugal
Por entre ruas quase desertas de notícias e ilhas de inovação digital, o jornalismo
local em Portugal vive um momento paradoxal. Nunca como hoje foi tão difícil manter
uma cobertura jornalística de proximidade, e nunca como hoje surgiram tantas tentativas
de reinventar esse mesmo jornalismo — online, em rede, em diálogo direto com as
comunidades.
Num país marcado por profundas assimetrias regionais e por uma crise estrutural da imprensa, o mapa do jornalismo local reflete desertos, mas também alguns oásis de criatividade.
Nos últimos anos, o termo “desertos de notícias” ganhou força no debate público.
O estudo Desertos de Notícias na Europa (Jerónimo et al., 2022) revelou que em muitas
regiões portuguesas — sobretudo no interior e em territórios de baixa densidade
populacional — as populações vivem hoje sem acesso regular a jornalismo local
profissional. É o caso, por exemplo, de vastas áreas no Alentejo ou em Trás-os-Montes.
Nestas regiões, as rádios locais sobrevivem com enormes dificuldades, os jornais em
papel fecharam ou foram reduzidos a edições simbólicas, e os sites locais, quando
existem, são pouco atualizados.
“O jornalismo de proximidade é o primeiro a sofrer nos momentos de crise dos
media, mas é também o que mais falta faz à coesão social”, explica Pedro Jerónimo,
investigador e autor de Ciberjornalismo de Proximidade (2017) (RTP, 2024). A lógica é
simples: quando faltam notícias sobre o que acontece no quotidiano das pessoas —
decisões municipais, eventos culturais, problemas ambientais — a democracia local
enfraquece. “Sem informação de proximidade, o espaço público local tende a ser
capturado por boatos, redes sociais não moderadas ou pela comunicação institucional,
que não substitui o jornalismo”, sublinha Jerónimo (2017).
Mais recentemente, a aposta passou pelo hiperlocal digital. Como defende Carla
Camponez (2017), há potencial em criar “novos pactos comunicacionais”, em que o
jornalismo local online atua em forte ligação com as comunidades, mais dialogante e
participativo. Nesta lógica, projetos jornalísticos históricos como o Notícias de Gouveia
procuram não apenas informar, mas também mobilizar o tecido social local (RTP, 2024).
Porém, o grande desafio continua a ser o da sustentabilidade. A proposta de
modelos de negócio em rede — desenvolvida na tese de doutoramento de Gabriela Ramos
(2023) — aponta para caminhos de esperança: associativismo entre pequenos media
locais, cooperação para compras tecnológicas e publicidade, ou sistemas de subscrição
comunitária. “Sem pensar em modelos de negócio alternativos, o jornalismo de
proximidade corre o risco de ficar preso a uma lógica de sobrevivência, sem capacidade
de inovação”, alerta.
Os próximos anos serão decisivos. A transição digital abriu novas possibilidades,
mas também agravou desigualdades. Enquanto nas grandes áreas metropolitanas surgem
experiências digitais bem-sucedidas, como o Lisboa Para Pessoas, em muitas regiões o
jornalismo local permanece em risco de extinção. Como sintetiza Jerónimo (2022), a
batalha pelo jornalismo local em Portugal é, em última análise, “uma batalha pela
democracia de proximidade”.
No final, o futuro do jornalismo local dependerá da capacidade de jornalistas,
comunidades e políticas públicas convergirem para soluções novas. Porque, como lembra
Camponez (2017), “num mundo cada vez mais globalizado, é no local que continua a
residir a dimensão mais tangível da cidadania”.
Uma televisão nascida nos corredores da escola – Entrevista a Tomás Duran (um dos
fundadores da TomarTV) (TTV)
A origem da TomarTV é, em si, uma história de juventude, criatividade e espírito
de iniciativa. Longe dos grandes estúdios ou redações profissionais, o projeto nasceu nos
corredores de uma escola secundária — um cenário improvável para uma futura
referência do jornalismo local.
Tudo começou quando um grupo de quatro estudantes do ensino secundário
decidiu inovar na forma de comunicar dentro da própria escola.

“Criámos uma das primeiras televisões escolares do país”, recorda Tomás. A
ideia era simples: aproveitar os intervalos para exibir uma programação feita pelos
próprios alunos. “Fazíamos uma emissão especial para passar nos intervalos da escola.
E aquilo começou a ter um grande sucesso e a atrair um monte de gente.”
O impacto foi imediato. A iniciativa revelou uma sede de informação e de novas
linguagens audiovisuais entre os estudantes — um público que já não se identificava com
os modelos rígidos e antiquados dos media tradicionais. Enquanto Marques (2023)
sublinha que “as camadas mais jovens raramente se envolvem ou identificam com os
media locais”, o projeto da TomarTV nasce da juventude e é para a juventude —
assumindo a missão de criar formatos mais atrativos, criativos e compatíveis com os
hábitos digitais contemporâneos.
“Sentíamos que existia um grande distanciamento entre o conteúdo que
gostávamos de consumir enquanto jovens e a forma como os medias tradicionais o
faziam.”
Com a conclusão do 12o ano, veio o desafio: como manter vivo aquele espírito
criativo e livre que havia florescido nos corredores escolares? A resposta foi ousada:
fundar um órgão regional de comunicação. Assim nasceu a TomarTV, com uma missão
clara de aproximar a informação do público local e, sobretudo, de criar um novo padrão
de jornalismo digital para a região.
Essa origem moldaria para sempre a identidade do projeto. Desde o início, a
TomarTV destacou-se pelo seu caráter jovem, experimental e independente —
características que ainda hoje a diferenciam no panorama de media regional.

Liberdade editorial como ponto de partida
Desde o início, os jovens fundadores da TomarTV tinham um objetivo claro:
construir um meio de comunicação livre, e o cenário que encontraram nos meios locais
era preocupante. “Existia sempre uma ligação demasiado forte entre o poder político
local e a forma como as notícias eram dadas”, relata Tomás. Muitas redações regionais,
ainda presas a estruturas obsoletas e com escassos recursos, reproduziam notas de
imprensa sem qualquer tipo de editoria ou linha editorial clara. “Ainda hoje frequentamos
os sites de rádios e jornais locais e o que vemos são notas de imprensa chapadas. Isso é
assustador.”
Essa constatação motivou o grupo a criar um projeto que fosse realmente
independente, onde as escolhas editoriais fossem pautadas por princípios jornalísticos,
não por interesses políticos ou económicos.
No entanto, o caminho não foi isento de riscos. A juventude e a paixão inicial
levaram, por vezes, a uma comunicação demasiado ousada: “Hoje confesso que às vezes
fomos irreverentes demais, fruto da idade que tínhamos. Às vezes íamos para o
extremismo de querer comunicar em excesso.” Ainda assim, foi essa ousadia que
despertou debates e quebrou padrões no panorama local.
A proposta da TomarTV foi justamente criar um canal transparente e digital, que
se apresentasse de forma clara ao seu público, livre de dependências. Esse compromisso
com a liberdade editorial tornou-se num marco identitário.
Jornalismo de proximidade e missão social
A TomarTV nasceu com uma missão social clara: criar uma comunicação que
sirva, respeite e fortaleça as comunidades locais.
Enquanto os grandes meios nacionais impõem uma agenda unificada, muitas
vezes centrada nos grandes centros urbanos, o jornalismo local permite uma narrativa
mais enraizada no território.
“O jornalismo regional é mais importante que o nacional”, afirma Tomás
Duran.“Permite informar um determinado grupo de pessoas com informações que são
realmente relevantes para aquela população.”

Essa função de proximidade vai além do mero foco geográfico. Trata-se de
valorizar o que acontece no quotidiano, dar voz à população e combater a sensação de
abandono que tantas regiões do interior sentem.
“Vivemos num país com coesão territorial extremamente desigual, em parte por
causa da falha na comunicação. A quantidade de notícias do litoral é muito maior do que
a do interior — não porque não aconteça nada no interior, mas porque faltam meios para
cobrir esses acontecimentos.”
Por isso, Tomás defende que o país deveria investir num sistema de informação
mais descentralizado — inspirado em modelos como o espanhol — em que cada região
tenha meios de comunicação fortes e integrados numa rede nacional.
O impacto de uma comunicação local bem estruturada seria profundo: reforçaria
a identidade cultural de cada região; promoveria a cidadania e o envolvimento cívico;
reduziria a ansiedade informativa ao oferecer conteúdos mais próximos e compreensíveis
e corrigiria desigualdades no acesso à informação.
“As pessoas estão overwhelmed por excesso de informação que não lhes diz
respeito. A informação local ajuda a recentrar o foco: o que acontece na minha rua, na
minha cidade, na minha vida.”
Esse espírito de missão social foi central em todas as fases da TomarTV e na mais
recente aposta num jornalismo positivo e construtivo, focado em conteúdos que realmente
acrescentem algo às comunidades.
“Tentamos seguir uma linha editorial mais positiva. Não queremos fazer um
jornalismo alarmista. Queremos acrescentar valor e ajudar a comunidade a compreender
e melhorar a sua própria realidade.”
Assim, o jornalismo de proximidade mostra todo o seu poder: ser não só um
serviço de informação, mas um instrumento de coesão social e desenvolvimento
democrático. Além do seu valor cívico e democrático, o jornalismo de proximidade pode
também constituir uma resposta concreta à crise estrutural que afeta o setor dos media.
Como referem Giovanni e Élmano (2023), com base em Camponez (2017), os media
locais possuem “características naturais que podem ajudar na solução da crise do
jornalismo, especialmente quanto aos modelos de negócios”. Entre essas características,
os autores destacam a possibilidade de atuação em nichos de mercado geograficamente
definidos, a maior probabilidade de fidelização das audiências — que podem apoiar
financeiramente os projetos através de assinaturas ou doações — e a capacidade de
produzir conteúdos ajustados a necessidades específicas da comunidade, algo que apenas
um meio profundamente enraizado no seu território consegue garantir. Neste sentido, o
jornalismo local deixa de ser visto como um vestígio do passado e passa a ser encarado
como uma via estratégica de futuro, capaz de conciliar sustentabilidade económica com
relevância social.
Coberturas que marcaram uma geração
Ao longo dos seus dez anos de existência, a TomarTV consolidou-se como um
exemplo do que o jornalismo local pode alcançar. Nenhuma cobertura simboliza melhor
esse espírito do que a dos incêndios de Pedrógão Grande, uma tragédia que marcou
Portugal e também a história da jovem redação.
Em junho de 2017, as chamas devastaram a região.
“O governo anunciou a lista de mortos no segundo dia do acontecimento, mas
aqueles números não batiam com os nossos dados. Criámos equipas que iam às
freguesias, às funerárias, falar com as pessoas.”
Num esforço que desafiava as limitações de um pequeno órgão local, cruzaram
informações, sem as facilidades tecnológicas e digitais dos grandes meios de
comunicação:“Não havia ferramentas para automatizar nada. Tudo era feito
manualmente, com uma motivação enorme em descobrir a verdade.”
Após o tratamento dos dados, a TomarTV comprovou publicamente que o
governo subestimara o número de vítimas. Essa revelação contribuiu para a queda da
Ministra da Administração Interna. Para um meio regional, operando com recursos
escassos, foi um feito retumbante:“Mostrámos que o jornalismo independente e livre,
mesmo sendo regional, pode e deve ter esse papel.”

Essa cobertura consagrou a TomarTV como um exemplo do poder do jornalismo
local digital: capacidade de proximidade, compromisso com a verdade, atuação
independente e rapidez na resposta e além do impacto institucional, o incidente fortaleceu
a relação da TomarTV com a sua audiência.
Reinvenção digital e diálogo com o público
Desde os seus primórdios, o projeto reconheceu o potencial das plataformas
digitais como facilitadoras de um modelo de comunicação descentralizado, inclusivo e
próximo da comunidade. A opção estratégica pelo digital esteve presente desde a
fundação do projeto:
“As plataformas digitais são sempre uma alavanca. Nós tínhamos a facilidade de
não ter os custos de um canal no cabo, com equipamentos pesadíssimos.”
Este reconhecimento foi determinante para o desenvolvimento de uma abordagem
multimodal, que se apoiou em canais como o Facebook, o YouTube e sistemas de
mensagens como o Messenger, criando um ecossistema de comunicação que conjugava
conteúdos informativos, participação cívica e interação em tempo real.
O Facebook desempenhou um papel central na estratégia de difusão da TomarTV,
tanto em termos de audiência como de construção da comunidade. A plataforma foi
utilizada não apenas como meio de promoção dos conteúdos produzidos, mas como um
verdadeiro canal de transmissão de eventos ao vivo.
“A certa altura atingimos números impressionantes no Facebook. A TomarTV teve
o direto de Facebook mais visto de sempre em Portugal.” Este recorde foi alcançado
durante a cobertura de um acontecimento de elevada carga noticiosa aliada a uma relação
particularmente próxima com as comunidades de portugueses no estrangeiro:
“Conseguimos ir buscar muitas comunidades de portugueses que viviam no
estrangeiro. E isso era uma ligação incrível.”
Este tipo de participação transnacional demonstra o potencial do digital para
ampliar o alcance do jornalismo local, permitindo que as comunidades portuguesas
mantenham um vínculo informativo e emocional com os seus territórios de origem (RTP,
2024).
Paralelamente, o YouTube serviu como plataforma complementar, funcionando
como um arquivo vivo das produções da TomarTV e permitindo a experiência de
formatos mais apelativos para as gerações mais jovens.
“Inspirámo-nos muito na altura, por exemplo, na MTV Brasil. Eles faziam uns noticiários
super criativos, com imagens, e aquilo era apetitivo para os jovens.”
A adaptação das linguagens visuais e narrativas foi um aspeto central desta reinvenção
digital: “A maneira de editar, para nós… demorávamos semanas para editar uma coisa
de 30 segundos, se quiséssemos ser mesmo perfeccionistas. (…) Hoje vemos influencers
a agarrar num microfone de lapela e a comunicarem sem o mínimo rigor. E eu acho que
é aí que nós estamos a perder muito.”
Outro elemento fundamental da estratégia digital da TomarTV foi a utilização de
sistemas de mensagens diretas, como o Messenger, que permitiram estabelecer um canal
de comunicação permanente e bidirecional com o público.
“Se antigamente as pessoas iam à redação entregar um cartaz na mão, hoje a
relação mudou completamente. Agora contactam diretamente via Messenger. Isso
permite gerir a informação de forma muito mais rápida e ouvir muito mais vozes.” Este
contacto direto não só facilitou a cobertura mais ágil de eventos locais como também
contribuiu para reforçar o papel da comunidade na definição das agendas jornalísticas,
promovendo um modelo de jornalismo mais participativo e horizontal.
Assim, ao recorrer a plataformas como Facebook, YouTube e Messenger, a
TomarTV não só alargou a sua audiência e reforçou a proximidade com o seu público,
como também contribuiu para renovar as linguagens e práticas do jornalismo local.
“Nunca existiu esta possibilidade de produzir com tanta qualidade e com custos tão
reduzidos. Mas é preciso manter o rigor e a arte de comunicar.”
Este equilíbrio entre
inovação tecnológica e responsabilidade editorial é talvez a lição mais importante que o
caso da TomarTV oferece ao ecossistema mediático português, num momento em que os
media locais enfrentam desafios profundos de sustentabilidade e relevância.
Desafios e futuro do jornalismo local
A experiência da TomarTV é reveladora: por trás do dinamismo editorial e da
criatividade, existe uma batalha constante por recursos, legitimidade e sustentabilidade.
“No regional, é quase um one-man-show. Mas é também aí que se ganha uma certa
experiência, que é necessária para os tempos que vivemos hoje.”
Enquanto grandes grupos nacionais contam com equipas multidisciplinares e
departamentos especializados, nas redações locais muitas vezes um só jornalista
desempenha múltiplos papéis: repórter, editor, operador de câmara, gestor de redes sociais
e até designer gráfico. Esta acumulação de funções é uma realidade comum nas redações
da região Centro, como evidenciado no estudo “Jornalismo Região Centro” (2020), onde
mais de 65% dos jornalistas afirmam produzir mais de 20 peças jornalísticas por trimestre,
frequentemente acumulando funções de escrita, fotografia e paginação.
Essa polivalência pode gerar uma experiência rica, mas também leva ao risco de
burnout e fragilidade operacional (Bastos, 2104), ademais, a falta de financiamento
adequado é um obstáculo permanente: “A forma de financiamento das publicações
passou a estar muito comprometida… Produzimos conteúdos de borla para as redes
sociais, que lucram com isso. E o que recebemos, como no caso do Google AdSense, é
insuficiente para sustentar um grupo.”
Em paralelo, a ausência de políticas públicas de apoio afeta estes profissionais:
“Os vários governos ouviram as vontades dos jornalistas regionais e nunca
quiseram fazer nada em relação à necessidade urgente de criar um plano de apoio.”
O resultado é um cenário assimétrico: enquanto algumas regiões possuem medias
locais fortes, outras permanecem em “desertos informativos”, o que aprofunda as
desigualdades de coesão territorial. A maioria dos profissionais mostra-se preocupada
com o futuro da profissão e, em alguns casos, admite já ter ponderado abandoná-la —
sobretudo devido ao baixo rendimento, à degradação das condições de trabalho e à falta
de valorização social (RTP, 2024).
No entanto, há sinais de resistência e criatividade. O mesmo estudo indica que
muitos jornalistas estão a apostar em novas ferramentas digitais, embora reconheçam
limitações de formação e infraestrutura. Mais de 20% dos profissionais trabalha hoje com
regularidade em ambientes online, e vários referem a necessidade urgente de repensar os
modelos de negócio
Conclusão: o futuro é local e digital
Se há algo que a trajetória da TomarTV revela, é que o jornalismo local não tem
apenas um lugar no ecossistema mediático atual — ele é fundamental. Ao unir a força das
plataformas digitais com a missão tradicional do jornalismo — informar, fiscalizar,
conectar comunidades, projetos como a TomarTV conseguem preencher lacunas que os
grandes meios não alcançam.

Em tempos de excesso de informação global, o público anseia por aquilo que tem
impacto direto na sua vida: a obra pública no bairro, a decisão política municipal, o
incêndio na serra vizinha, ou o evento cultural da vila. É justamente aí que o jornalismo
local atua com relevância única.
O digital não apenas potencializou esse alcance — tornando possível que um
pequeno grupo de jovens levasse notícias regionais a milhares de pessoas, incluindo no
estrangeiro — como também trouxe novas linguagens, formatos e possibilidades de
interação. Plataformas como Facebook, YouTube, Instagram democratizaram a produção
audiovisual e permitiram coberturas mais criativas e acessíveis.
Contudo, essa revolução traz também os seus riscos. A dependência de algoritmos
de grandes plataformas estrangeiras compromete a sustentabilidade financeira do
jornalismo local. A falta de apoio institucional agrava ainda mais este quadro:
“Se não existir um plano de apoio agora, no período de transição para o digital,
o que perdemos não é o papel. É o conhecimento, o legado do jornalismo português.”
afirma Tomás Duran.
A frase é um alerta claro. Sem políticas públicas que reconheçam o valor
estratégico do jornalismo local — para a coesão territorial, para o fortalecimento da
democracia e para o combate à desinformação — o país corre o risco de aprofundar
desigualdades informativas já latentes.
Ainda assim, começam a surgir respostas do poder público. Em fevereiro de 2024,
foi publicado o Despacho n.o 14327-A/2024, que definiu os apoios estatais à comunicação
social local por região e por tipologia de investimento. A Região Centro, onde se insere a
TomarTV, recebeu um total de 30.491,84 euros, sendo cerca de 22 mil euros destinados à
modernização tecnológica e 8 mil euros ao desenvolvimento digital (Governo de
Portugal, 2024). Embora o valor total represente uma fração modesta em comparação
com outras regiões — como os mais de 313 mil euros atribuídos à Região Norte —, o
montante pode ainda assim representar um impulso relevante para projetos locais.
Contudo, é a região que menos recursos recebeu em 2024, o que cria um alerta sobre a
desigualdade no acesso aos fundos públicos.
Torna-se essencial garantir que os apoios não só existam, mas que sejam
distribuídos de forma equitativa, com critérios transparentes e que cheguem efetivamente
a projetos inovadores e independentes. Como o estudo “Jornalismo na Região Centro:
Trabalho, Tecnologia e Negócio” (2020) revela, os desafios enfrentados pelos media
regionais não se resumem à escassez de recursos financeiros ou humanos. São também
desafios de identidade profissional, de adaptação tecnológica e de reinvenção do papel
social do jornalista local. Ao mesmo tempo, persistem oportunidades concretas: bases de
leitores fiéis, forte ligação às comunidades e potencial de inovação digital.
O apoio público é importante, mas precisa de estar alinhado com as realidades no
terreno, para que possa cumprir o seu papel de fortalecer o ecossistema informativo
regional.
Por outro lado, há sinais de esperança. A nova geração de jornalistas, nativos
digitais, está mais preparada para explorar as potencialidades do local. Projetos
independentes e inovadores, mostram que é possível construir um jornalismo mais
próximo, mais livre e mais relevante.
Esse futuro poderá ser local e, inevitavelmente, digital.
